sexta-feira, 19 de outubro de 2007

"O Analfabeto Político" - Bertolt Brecht

"Estamos construindo o Novo Poder"

Entrevista de Rafael Reyes [*]


Red Resistencia enviou uma equipe jornalística às selvas colombianas a fim de conhecer de perto a realidade da legendária guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC-EP). A entrevista que se segue foi efectuada foi efectuada num acampamento do sul do país. O entrevistado é o comandante Rafael Reyes, responsável pela formação de quadros de um dos blocos insurgentes. Recrutamento, trabalho clandestino, o "Novo Poder", guerra mediática e a nova fase da guerra nas cidades são alguns dos temas analisados pelo cmte. Rafael Reyes.



Red Resistencia: Comandante Rafael Reyes, qual o seu papel nas FARC-EP?


Rafael Reyes: Entrei nas FARC-EP como combatente raso, a seguir foram-me dando algumas responsabilidades que me permitiram receber uma formação integral como guerrilheiro revolucionário. O meu trabalho centrou-se sobretudo no aspecto político-organizativo, organizando comunidades, contribuindo internamente para o trabalho do organismo político, elevando a capacidade das células, que são as estruturas políticas mais importantes no seio das FARC-EP. Aqui estou cumprindo meu papel como comunista, que é ajudar na formação política e ideológica e cultural do colectivo das FARC.


Isto foi uma escola importante para mim. Antes de entrar na guerrilha uma pessoa tenta imaginá-la, mas só quando se está dentro se percebe que isto é uma verdadeira universidade da revolução. É na prática diária que se vai aprendendo a conhecer as pessoas, a entender suas dificuldades e o porque da sua incorporação ao nosso exército revolucionário. Isso é um processo teórico-prático. Nas FARC-EP temos um conceito de formação integral dos quadros revolucionários. A este aspecto da formação damos uma grande importância, já que nos permite não só preparar-nos ao nível do discurso como também no campo militar. Aqui há que aprender todas as especialidades que existem na guerrilha, como o manejo de explosivos, artilharia, organização de massas, propaganda, etc.


Diz-se que as FARC-EP são um Partido Comunista. Como pode um partido político ser ao mesmo tempo um exército revolucionário?


Somos uma organização político-militar revolucionária que se orienta de acordo com os princípios do marxismo-leninismo e do pensamento do nosso Libertador Simón Bolívar e de todo o pensamento revolucionário da América Latina. Nossa organização político-militar tem uma estrutura orgânica como força militar formada por esquadras, guerrilhas, companhias, colunas, frentes e blocos. Mas também uma estrutura hierárquica, pois cada uma destas estruturas tem seus comandos, quer sejam comandantes, substitutos ou terceiros no comando. A esquadra é a estrutura básica militar, mas em nossa organização é ao mesmo tempo uma célula política. Assim como na esquadra existe o comando militar, a célula também tem os seus próprios dirigentes políticos. Neste nível já existe formação de quadros político-militares. A célula comunista para nós tem uma importância vital, pois é ali que manejamos as questões quotidianas da vida, especialmente aquilo que tem a ver com a formação de quadros. É na célula que o combatente desenvolve sua capacidade política. Na célula o guerrilheiro deve estudar todos os documentos de nossas conferências, dos Plenos do Estado Maior Central, de atualização política, etc. É ali na célula que nos vamos formando nas idéias revolucionárias.


Como se entra nas FARC-EP?


A maioria dos nossos combatentes provem de estratos sociais muito humildes. Muitos deles foram vítimas do terrorismo do Estado e decidem entrar na guerrilha porque aqui vêm um futuro e sobretudo vêm a garantia de defender a sua própria vida. A maioria são jovens que não tiveram oportunidades, porque o Estado não lhes deu nada. Também temos guerrilheiros que provém de estratos médios e altos. Trata-se sobretudo de lutadores sociais aos quais não lhes restou outra alternativa senão a luta armada a fim de continuar a sonhar por uma sociedades mais justa. A idade de recrutamento nas FARC-EP é dos 16 aos 30 anos. Nos nossos acampamentos pode haver menores de idade mas não estão ali na qualidade de combatentes. Estes menores estão a receber a educação que o Estado lhes negou. Nossa organização faz uma seleção muito rigorosa dos seus integrantes. Um jovem antes de entrar para a nossas fileiras passa por todo um processo. A primeira coisa que fazemos é explicar-lhe do que se trata. Que compromisso vai assumir com nossa organização. Para isso é necessário explicar-lhe o que são as FARC-EP, porque luta, qual o seu projeto político, quais suas normas, regulamentos e estatutos. Tudo isto para que o jovem tenha todos os elementos para decidir se deseja realmente entrar no nosso exército e assumir assim seu compromisso com o projeto revolucionário. O jovem combatente compromete-se em primeiro lugar a lutar em defesa dos interesses do seu povo. Em segundo lugar, a levar adiante o plano estratégico das FARC-EP. Em terceiro, a cumprir com os planos e tarefas que decorram do mesmo plano. E em quarto lugar a cumprir os regulamentos, princípios e estatutos, assim como a seguir as linhas políticas e ideológicas da organização.


A decisão de incorporar-se ele tem que tomá-la livremente. Nós não fazemos nenhum tipo de recrutamento forçado. A entrada nas FARC-EP é voluntária. Aqui o guerrilheiro não recebe nenhum salário. Dá-se-lhe tudo o que precisa para viver e combater.


Como se vai ascendendo na estrutura das FARC-EP desde guerrilheiro raso até Comandante em Chefe?


O jovem atravessa todo um processo de formação político-militar, cultural e ideológica. Na etapa de recrutamento os jovens vão a uma escola básica de recrutas que pode durar de três a cinco meses. Ali adquirem o conhecimento básico do guerrilheiro. A primeira coisa que vão conhecer é o porque lutamos. Damos-lhe a conhecer o "Programa Agrário dos Guerrilheiros", a "Plataforma para um Governo de Reconstrução e Reconciliação Nacional", que o programa do Movimento Bolivariano pela Nova Colômbia; estudam-se também três documentos importantes: os estatutos, o regime interno disciplinar e as normas internas de comando, que são a coluna vertebral das nossas normas. Uma vez finalizada esta etapa pode-se dizer que está pronto para entrar no grosso da tropa.


Estando já nas unidades das FARC, o jovem inicia a sua carreira como profissional revolucionário. Nossas normas dizem que depois de dois anos, de acordo com a sua experiência, comportamento, valor, entrega e espírito de superação, assim como a sua responsabilidade e à qualidade do seu trabalho, já se podem dar cargos de responsabilidade ao guerrilheiro. A primeira coisa que fazemos é promove-lo a comando. Inicia-se como substituto de esquadra. É a partir desse momento que começa a receber graus: comandante de esquadra, substituto de guerrilha, comandante de guerrilha, e assim por diante até que vai adquirindo graus de maior responsabilidade como pode ser o de substituto ou comandante de coluna. Neste nível o combatente já pode atuar como comandante de frente ou membro de Estado Maior de Frente.


Depois de ser comandante de frente começa-se a receber outros graus como o de ser membro do Estado Maior de Bloco, comandante ou substituto de Bloco. Para ir depois adquirindo maiores responsabilidades até chegar a ser membro do Estado Maior Central, e dali ser membro do Secretariado, que é o cargo máximo e que atualmente é integrado por sete camaradas. O camarada Manuel Marulanda Vélez atua como membro do Secretariado e como Comandante em Chefe das FARC-EP.


O que propõem as FARC-EP ao povo colombiano?


O objectivo final do nosso projeto revolucionário é a tomada do poder a fim de construir uma nova sociedade, uma Nova Colômbia em paz com justiça social. É conseguir levar à prática o "Programa Agrário dos Guerrilheiros". Para alcançar esse objectivo é necessário percorrer algumas etapas. Estamos afirmando a necessidade de formar um governo de convergência democrática, um governo de reconstrução e reconciliação nacional com um programa muito concreto que está refletido na "Plataforma de 10 pontos" aprovada na VIII Conferência das FARC-EP e foi reajustado no último plenário do Estado Maior Central de Março de 2000. Como organização ampla, estamos a propor ao povo colombiano, às maiorias, que apoiem e levem adiante o projecto do Movimento Bolivariano pela Nova Colômbia .


Estamos impulsionando outras propostas organizativas para levar adiante o projecto estratégico das FARC-EP. Estamos organizando as Milícias Bolivarianas nas comunidades, nos bairros, no campo. Neste processo estamos a vincular todos aqueles que queiram lutar pela defesa dos interesses do povo, da sua terra, os que estão contra a corrupção, o Terrorismo de Estado, os que queiram defender sua vida, assim como vincular todos aqueles que queiram lutar por uma mudança deste regime de terror na Colômbia.


Estamos a organizar e estruturar o Partido Comunista Clandestino para dar ao povo mais um instrumento de luta, sem que suas vidas corram os riscos da atividade política aberta. A nível das organizações sociais estamos contribuindo para que se fortaleçam todas as expressões comunitárias a fim de que as comunidades possam exigir ao Estado que invista no social os grandes recursos econômicos que estão a dilapidar no monstruoso aparelho de guerra estatal.


Estamos dando a conhecer nossas propostas ao povo colombiano. Estamos dando a conhecer porque lutamos, qual é nossa proposta de paz com justiça social, de mudança, de substituição de cultivos ilícitos. Por isso é que estamos a convidar o povo a que se organize e lute para alcançar estes objetivos.


O Partido Comunista Clandestino (PCCC) e o Movimento Bolivariano pela Nova Colômbia são organizações clandestinas. Por que este caráter?


A oligarquia militarista deste país, aliada ao imperialismo norte-americano, pôs em prática todos os métodos repressivos contra o povo colombiano. Utilizando os grupos paramilitares tentou semear o pânico e o terror a fim de que as pessoas não se vinculassem ao processo revolucionário. Este método é conhecido pelo nome de "tirar a água ao peixe". Há comunidades que foram duramente golpeadas pelo Terrorismo de Estado, quer através de massacres como de assassinatos seletivos. Cidadãos humildes, líderes comunais, dirigentes de cooperativas, sindicalistas e líderes de bairro foram massacrados a sangue e fogo por este regime excludente e intolerante. Foi o próprio povo que nos disse que é preciso trabalhar em outras condições e foi por isso que decidimos que enquanto não houver condições para avançar um trabalho político aberto, o nosso trabalho deverá efetuar-se de forma clandestina. É por isso que o PCCC, o Movimento Bolivariano e as Milícias Bolivarianas têm um carácter eminentemente clandestino.


Existe uma grande ofensiva do Estado colombiano e dos meios de comunicação do estabelecimento para deslegitimar a luta das FARC-EP. O que fazem para contrariar esta ofensiva?


Com a queda da União Soviética, os ideólogos burgueses e os meios de comunicação ao serviço do grande capital tentaram desvirtuar a luta revolucionária. Há uma grande campanha de desinformação e de operações psicológicas que fazem parte desta guerra sofrida pelos colombianos. Com isto pretendem convencer o povo de que desapareceu o espaço para a luta de classes, que hoje já não é possível a luta dos povos e que a luta armada perdeu validade. Pretendem convencer-nos de que não existe outra alternativa ao capitalismo selvagem.


Na Colômbia, os militares atribuíram-se a tarefa de ganhar-nos a guerra a partir dos gabinetes e através dos media. Esta é uma guerra cada vez mais midiáticas. Os comunicados militares do exército são na maioria dos casos puras mentiras. A luta nesse terreno é muito desigual, uma vez que não contamos nem com os meios nem com os recursos que eles têm ao seu serviço.


Nossa organização está neste momento a fazer um grande esforça para combater nesta frente de batalha. Editamos a revista "Resistência" em vários níveis: edição nacional, edição internacional, edição por blocos e por frentes. Ao nível dos blocos editamo-la com a importante tiragem de 20 mil exemplares por cada bloco. Além da revista publicamos comunicados, volantes, afixáveis, etc. Por outro lado, estão a funcionar as emissoras da Voz de la Resistencia de la Cadena Bolivariana. Cada bloco conta com uma emissora FM. A meta é que cada frente conte com sua própria emissora e sua própria revista Resistência.


Como é o trabalho das FARC-EP com as comunidades?


Com as comunidades estamos procurando construir o "Novo Poder". Isto explica nossa política de exigir aos alcaides que renunciem. Vemos que os alcaides já não estão a cumprir nenhum papel ao serviço das comunidades. Essa experiência já a vivemos com os inspetores de polícia. As pessoas começaram a desconhecer a sua autoridade e dirigiam-se a nós para solucionar seus problemas. Dizíamos às comunidades que os acordos a que chegassem nós os faríamos respeitar, mas com a condição de que as partes em conflito deveriam aceitar as decisões e ficar amigas. Isso tem funcionado e por isso os inspectores de polícia perderam sua razão de ser.


Atualmente, os alcaides é que perderam sua razão de ser. Primeiro, porque esses alcaides esquecem as comunidades que os elegeram. Muitos alcaides só trabalham para os sectores que os apoiaram nas urnas, esquecendo os demais. Segundo, a maioria das alcaidias converteram-se num foco de corrupção, injustiça e clientelismo. A estes alcaides estamos a exigir que renunciem. É por isso que estamos convocando as comunidades a se organizarem elas próprias, gerirem e administrarem seus recursos, uma vez que elas conhecem suas próprias necessidades. Nós e a comunidade vamos estar ali fiscalizando esse novo embrião de poder local que estamos a criar nos municípios e nas freguesias. É a isso que chamamos "O Novo Poder". Isto já é uma realidade em muitas comunidades. Com isto procuramos, antes de tudo, que as comunidades recuperem o seu protagonismo. Em segundo lugar, que comecem a fazer o inventário das suas riquezas, da terra, como está destruída, que conheçam quem são os que produzem a riqueza e quem são os que se aproveitam delas, como de distribui, e estamos a dizer a essas comunidades que façam um inventário das suas necessidades reais, para poder investir eficientemente os recursos.


As FARC-EP entraram numa fase de guerra nas cidades. Qual é o objetivo desta nova etapa?


O mapa demográfico da Colômbia mudou radicalmente nos últimos 30 anos. Hoje em dia, quase 85% da população colombiana vive em centros urbanos, em resultado do deslocamento forçado que levou muitos camponeses a procurarem refúgio nas cidades. Dentre da sua estratégia de guerra, o inimigo pretende deixar deserto o campo através do seus projeto paramilitar. Por um lado pretende apoderar-se das suas terra, e pelo outro tirar-nos o apoio que temos na população camponesa, que é muito elevado. Foi assim que nos últimos anos estes deslocados vêm-se assentando nos cinturões de pobreza das grandes cidades. A realidade é que os camponeses foram com os seus problemas para a cidade. Foram perseguidos no campo e agora são perseguidos na cidade. Anteriormente, eram bombardeados no campo de forma indiscriminada. Agora também o são nas cidades. Para eles , isto não é um fenômeno novo. A isto temos de somar o desemprego, a marginalidade, o desamparo estatal e a pobreza absoluta. Há setores que estão aguentando fome física. Tudo isto faz com que estes setores excluídos da riqueza do país lutem pela melhoria das suas condições de vida. E é aí que estamos nós com nossas propostas. Estamos a organizar ali as milícias, o PCCC e o Movimento Bolivariano a fim de preparar o povo colombiano para a insurreição armada. Com o objetivo de acabar de uma vez por todas com este regime de terror e exclusão.


Neste momento temos milícias em todas as cidades colombianas. Em Bogotá e Medellín já se começaram a sentir. Logo a sua atuação será sentida em toda a Colômbia, uma vez o povo colombiano não aguenta mais esta situação de repressão e injustiça social.


[*] Comandante de las FARC-EP

Mais informação sobre as FARC-EP em http://www.farcep.org/

Esta entrevista encontra-se em http://resistir.info .

O Socialismo e o Homem em Cuba

Comandante Ernesto "Che" Guevara

Estimado Companheiro,

(Guevara refere-se a Carlos Quijano, do semanário Marcha, de Montevidéu.).

Estou terminando estas notas durante minha viagem pela África, animado pelo desejo de cumprir, ainda que tardiamente, minha promessa. Gostaria de fazê-lo desenvolvendo o tema do título. Penso que pode ser interessante para os leitores do Uruguai.

É comum ouvir da boca dos porta-vozes do capitalismo, como um argumento na luta ideológica contra o socialismo, a afirmação de que este sistema social, ou o período de construção do socialismo que estamos atualmente vivendo, se caracteriza pela abolição do indivíduo no altar do Estado. Não tentarei refutar esta afirmação a partir de uma base meramente teórica, mas sim estabelecer os fatos tal como acontecem em Cuba e acrescentar comentários de caráter geral. Primeiro esboçarei em pinceladas á história de nossa luta revolucionária antes e depois da tomada do poder.

Como se sabe, a data exata em que se iniciaram as ações revolucionárias que culminaram com o 1° de janeiro de 1959, foi 26 de julho de 1953. Um grupo de homens dirigidos por Fidel Castro atacou na madrugada desse dia o quartel Moncada na Província de Oriente. O ataque foi um fracasso, o fracasso se transformou em desastre e os sobreviventes foram parar na prisão, para reiniciar, logo depois de terem sido anistiados, a luta revolucionária.

Durante este processo existiam apenas germes de socialismo e o homem era um fator fundamental. Nele se confiava, era individualizado, específico, com nome e sobrenome, e o triunfo ou o fracasso da ação empreendida dependia da sua própria capacidade.

Chegou a etapa da luta guerrilheira. Esta se desenvolveu em dois ambientes diferentes: o povo, massa ainda adormecida que precisava ser mobilizada, e sua vanguarda, a guerrilha, motor impulsor do movimento, gerador de consciência revolucionária e de entusiasmo combativo. Esta vanguarda foi o agente catalisador, aquele que criou as condições subjetivas necessárias à vitória. Na vanguarda também, no interior do processo de proletarização do nosso pensamento, da

revolução que se processava em nossos hábitos e nossas mentes, o indivíduo foi o fator fundamental. Cada um dos combatentes da Sierra Maestra que alcançou algum grau superior nas forças revolucionárias tem em seu haver uma história de fatos notáveis. Era em função destes fatos que ele conseguia seus galões.

Esta foi a primeira época heróica, na qual se disputava para conseguir um cargo de maior responsabilidade, onde o perigo era maior sem outra satisfação que a do dever cumprido. No nosso trabalho de educação revolucionária voltamos bastante sobre este tema educativo. Na atitude dos nossos combatentes visualizava-se o homem do futuro.

Este fato da entrega total à causa revolucionária se repetiu em outras oportunidades na nossa história. Durante a crise de Outubro ou durante os dias do furacão Flora, pudemos constatar atos de valor e de sacrifícios extraordinários realizados por um povo inteiro. Uma das nossas tarefas fundamentais do ponto de vista ideológico e a de encontrar a fórmula para perpetuar esta atitude heróica na vida quotidiana.

Em janeiro de 1959, o governo revolucionário se estabeleceu com a participação de vários membros da burguesia entreguista. A presença do exército rebelde constituía a garantia do poder, um fator fundamental de força.

Em seguida ocorreram contradições sérias, resolvidas em primeira instância em fevereiro de 1959, quando Fidel Castro assumiu a chefia do governo no cargo de Primeiro Ministro. O processo culminava com a renúncia do presidente Urrutia diante da pressão das massas em julho do mesmo ano.

Neste momento aparecia na história da revolução cubana, com características bem nítidas, um personagem que de agora em diante estará sistematicamente presente: a massa.

Este ente de múltiplas facetas não e, como se pretende, a soma de elementos de uma mesma categoria (reduzidos, aliás, a uma mesma categoria por imposição do sistema), que atua como um manso rebanho. É verdade que segue sem vacilar seus dirigentes, principalmente Fidel Castro; mas o grau desta confiança que ele conquistou está em função precisamente da interpretação cabal dos desejos do povo, de suas aspirações e da luta sincera que ele travou para o cumprimento das promessas feitas.

A massa participou na Reforma Agrária e no difícil empenho de administrar as empresas estatais; passou pela experiência heróica de

Playa Girón; forjou-se nas lutas contra as várias hordas de bandidos armados pela CIA; viveu uma das definições mais importantes dos tempos modernos na crise de Outubro e está hoje trabalhando para a construção do socialismo.

Se olhamos as coisas de um ponto de vista superficial, pode parecer que aqueles que falam da subordinação do indivíduo ao Estado têm razão; a massa realiza com um entusiasmo e uma disciplina sem par as tarefas determinadas pelo governo, sejam elas de caráter econômico, cultural, de defesa, esportivo, etc. A iniciativa parte geralmente de Fidel ou do alto comando da revolução, é explicada ao povo, que a acata como sendo sua. Outras vezes o Partido e o governo escolhem experiências localizadas e generalizam-nas seguindo o mesmo procedimento.

No entanto, às vezes o Estado está errado. Quando um desses erros se produz, nota-se uma diminuição do entusiasmo coletivo através de uma diminuição quantitativa de cada um dos elementos que formam este coletivo, e o trabalho diminui até ficar reduzido a proporções insignificantes: esse e o momento de corrigir. Isso aconteceu em março de 1962, diante da política sectária imposta ao Partido por Aníbal Escalante.

É evidente que o mecanismo não e suficiente para assegurar uma série de medidas sensatas e que falta uma conexão mais estruturada com a massa. Devemos melhorar isso no decorrer dos próximos anos, mas para o caso das iniciativas provindas das instâncias superiores do governo, utilizamos por enquanto o método quase intuitivo de auscultar as reações gerais face aos problemas colocados.

Fidel é mestre nisso e seu modo particular de integração com o povo só pode ser apreciado vendo-o atuar. Nas grandes concentrações públicas observa-se algo como o diálogo de dois diapasões, cujas vibrações provocam outras no interlocutor. Fidel e a massa começam a vibrar num diálogo de intensidade crescente até alcançar o clímax num final abrupto coroado por nosso grito de luta de vitória.

O que fica difícil entender para quem não vive a experiência da revolução e esta estreita unidade dialética existente entre o indivíduo e a massa, onde ambos se inter-relacionam, e a massa por sua vez, enquanto conjunto de indivíduos, se inter-relaciona com os dirigentes.

No capitalismo pode-se verificar alguns fenômenos desse tipo quando aparecem políticos capazes de conseguir a mobilização

popular, mas se não se tratar de um autêntico movimento social, e nesse caso não e totalmente lícito falar de capitalismo, o movimento durará enquanto durar a vida de quem o impulsiona ou até o fim das ilusões populares, imposto pelo rigor da sociedade capitalista. Nesta sociedade o homem é dirigido por uma ordem fria que habitualmente escapa ao domínio de sua compreensão. O indivíduo alienado tem um cordão umbilical invisível que o liga à sociedade no seu conjunto: a lei do valor. Ela atua em todos os aspectos de sua vida, modela seu caminho e seu destino.

As leis do capitalismo, invisíveis para o homem comum e cegas, atuam sobre o indivíduo sem que este o perceba. Ele vê apenas a amplitude de um horizonte que parece infinito. É apresentado desse modo pela propaganda capitalista, que pretende tirar do caso Rockefeller verídico ou não uma lição sobre as possibilidades de êxito. A miséria que é necessária acumular para que surja um exemplo como este e a quantidade de desgraças que uma fortuna dessa magnitude ocasionou para poder existir não aparecem no quadro, e nem sempre as forças populares têm a possibilidade de aclarar estes conceitos. (Caberia aqui uma indagação sobre como, nos países imperialistas, os trabalhadores perdem seu espírito de classe internacional por causa de uma certa cumplicidade na exploração dos países dependentes e como este fato ao mesmo tempo diminui o espírito de luta das massas no próprio país; mas este é um tema que foge ao propósito destas notas).

De qualquer maneira, mostra-se o caminho com obstáculos que, aparentemente, o indivíduo com as qualidades necessárias pode superar para chegar até a meta final. O prêmio é visualizado a distância; o caminho é solitário. Além de tudo é preciso transformar-se em lobo pode-se chegar apenas à custa do fracasso de outros.

Tentarei agora definir o indivíduo, ator desse estranho e apaixonante drama que e a construção do socialismo, em sua dupla existência de ser único e membro da comunidade.

Penso que o mais simples é reconhecer sua qualidade de não feito, de produto não acabado. As taras do passado se transmitem até o presente na consciência individual e há necessidade de se fazer um trabalho contínuo para erradicá-las.

O processo é duplo: por um lado a sociedade atua com sua educação direta e indireta, por outro lado o indivíduo se submete a um processo consciente de auto-educação.

A nova sociedade em formação deve competir muito duramente com o passado. Isto se faz sentir não apenas na consciência individual, na qual pesam os resíduos de uma educação sistematicamente orientada para o isolamento do indivíduo, mas também pelo próprio caráter desse período de transição, onde permanecem as relações mercantis. A mercadoria e a célula econômica da sociedade capitalista; enquanto existir, seus efeitos se farão sentir na organização da produção e, em conseqüência, na consciência.

No esquema de Marx se concebia o período de transição como resultado da transformação explosiva do sistema capitalista destruído por suas contradições; na realidade posterior viu-se como caem da árvore imperialista alguns países que constituem os ramos mais débeis, fenômeno previsto por Lênin. Nesses países o capitalismo se desenvolveu suficientemente para fazer sentir seus efeitos de um ou outro modo sobre o povo, mas não são suas próprias contradições que, esgotadas todas as possibilidades, fazem explodir o sistema. A luta de libertação contra um opressor externo, a miséria provocada por acidentes estranhos como a guerra, cujas conseqüências fazem recair as classes privilegiadas sobre os explorados, os movimentos de libertação destinados a derrotar regimes neocolonialistas, são os fatores habituais do desencadeamento. A ação consciente faz o resto.

Nestes países não se produziu ainda uma educação completa para o trabalho social, a riqueza está longe de poder chegar às massas através do simples processo de apropriação. O subdesenvolvimento por um lado e a habitual fuga de capitais até países "civilizados" por outro tornam impossível uma mudança rápida e -sem sacrifícios. Resta um grande caminho a percorrer na construção da base econômica, e a tentação de seguir pelos caminhos do interesse material como alavanca impulsora de um desenvolvimento acelerado é muito grande.

Corre-se o perigo de que as árvores impeçam de ver o bosque. Perseguindo a quimera de realizar o socialismo graças às armas que nos legou o capitalismo (a mercadoria como célula econômica, a rentabilidade, o interesse material individual como alavanca, etc.), pode-se chegar a um beco sem saída. Pode-se percorrer uma longa distância na qual os caminhos se cruzam muitas vezes e onde é difícil perceber o momento em que se errou de caminho. Entretanto, a base econômica adaptada fez seu trabalho de corrosão sobre o desenvolvimento da consciência. Para construir o comunismo, paralelamente à base material tem que se fazer um homem novo.

Daí a importância de escolher corretamente o instrumento de mobilização das massas. Esse instrumento deve ser de índole moral fundamentalmente, sem esquecer uma correta utilização do estímulo material, sobretudo de natureza social.

Como já disse, num momento de perigo extremo é fácil potencializar os estímulos morais; para manter sua vigência, é necessário que se desenvolva um consciência na qual os valores adquiram categorias novas. A sociedade em seu conjunto deve se transformar em uma gigantesca escola.

As grandes linhas do fenômeno são semelhantes ao processo de formação da consciência capitalista em sua primeira fase. O capitalismo recorre à força, mas também educa as pessoas dentro do sistema. A propaganda direta é realizada pelos encarregados de explicar a perenidade de um regime de classe, seja de origem divina ou por imposição da natureza como ente mecânico. Isso aplaca as massas, que se vêem oprimidas por um mal contra o qual não e possível lutar.

Em seguida vem a esperança, e neste ponto que se diferencia dos regimes anteriores de casta, que não apontavam saídas possíveis.

Para alguns continuará vigente ainda a forma de castas: o prêmio para os obedientes consiste no acesso, depois da morte, a outros mundos maravilhosos onde os bons são premiados, como acontece na velha tradição. Para outros há inovação: a separação em classes é fatal, mas os indivíduos podem sair da classe a que pertencem através do trabalho, da iniciativa, etc. Este processo e. o da auto-educação para o triunfo devem ser profundamente hipócritas: é a demonstração interessada de que uma mentira é verdade.

No nosso caso, a educação direta adquire uma importância muito maior. A explicação e convincente porque é verdadeira: não precisa de subterfúgios. Ela se exerce através do aparato educativo do Estado em função da cultura geral, técnica e ideológica, por meio de organismos como o Ministério da Educação e o aparelho de divulgação do partido. A educação penetra nas massas e a nova atitude preconizada tende a converter-se em hábito; a massa vai incorporando-a e pressiona quem ainda não se educou. Essa é a forma indireta de educar as massas, tão poderosa quanto a outra.

Mas o processo é consciente: o indivíduo recebe continuamente o impacto do novo poder social e percebe que não está completamente adequado a ele. Sob a influência da pressão que supõe a educação indireta, ele trata de acomodar-se a uma situação

que sente como justa e cuja própria falta de desenvolvimento o tinha impedido de fazê-lo até agora. Ele se auto-educa.

Neste período de construção do socialismo podemos ver o homem novo que está nascendo. Sua imagem ainda não está acabada, nem poderia, já que o processo anda paralelo ao desenvolvimento de formas econômicas novas. Tirando aqueles cuja falta de educação os faz tender para o caminho solitário, para a auto-satisfação de suas ambições, aqueles que mesmo dentro desse novo panorama de marcha conjunta têm a tendência de caminhar isolados da massa que acompanham, o importante é que os homens adquirem cada dia maior consciência da necessidade de sua incorporação à sociedade e, ao mesmo tempo, de sua importância como motores da mesma.

Eles já não andam sozinhos por caminhos perdidos em direção a longínquas aspirações. Eles seguem a vanguarda constituída pelo Partido, pelos operários mais avançados e pelos homens da vanguarda que caminham ligados às massas e em estreita comunicação com elas. As vanguardas têm os olhos voltados para o futuro e sua recompensa, mas esta não é vista como algo individual; o prêmio é a nova sociedade, na qual os homens terão características diferentes: a sociedade do homem comunista.

O caminho é longo e cheio de dificuldades. Às vezes, por ter-se enganado de caminho, tem que, retroceder; outras vezes, por caminhar depressa demais, nos separamos das massas; em certas ocasiões, por fazê-lo lentamente, sentimos a presença próxima dos que pisam nos nossos calcanhares. Em nossa ambição de revolucionários tentamos caminhar tão depressa quanto possível, abrindo caminhos; mas sabemos que temos que nutrir-nos da massa e essa somente poderá avançar mais rápido se a animamos com nosso exemplo.

Apesar da importância dada aos estímulos morais, o fato de existir a divisão em dois grupos principais (excluindo, claro, a facção minoritária dos que não participam por uma razão ou outra da construção do socialismo) aponta a relativa falta de desenvolvimento da consciência social. O grupo de vanguarda é ideologicamente mais avançado que a massa; esta conhece os novos valores, mas insuficientemente. Enquanto nos primeiros se dá uma mudança qualitativa que lhes permite se sacrificar na sua função de vanguarda, os segundos apenas seguem e devem ser submetidos a estímulos e pressões de certa intensidade; é a ditadura do proletariado que se

exerce não somente sobre a classe derrotada, mas também individualmente sobre a classe vencedora.

Tudo isto implica, para seu êxito total, a necessidade da existência de uma série de mecanismos que são as instituições revolucionárias. Na imagem das multidões marchando para o futuro se encaixa o conceito de institucionalização como o de um conjunto harmônico de canais, escalões, comportas, aparatos bem azeitados que permitam essa marcha, que permitam a seleção natural daqueles destinados a caminhar na vanguarda e que concedam o prêmio aos que cumprem e o castigo aos que atentem contra a sociedade em construção.

Esta institucionalidade da revolução ainda não foi alcançada. Buscamos algo novo que permita a perfeita identificação entre o governo e a comunidade em seu conjunto, ajustada às condições peculiares à construção do socialismo e fugindo ao máximo dos lugares comuns da democracia burguesa, transplantados para a sociedade em formação (como as câmaras legislativas, por exemplo). Foram feitas algumas experiências no sentido de se criar progressivamente a institucionalização da revolução, mas sem maior pressa. O freio maior que encontramos foi o medo de que qualquer aspecto formal nos separe das massas e do indivíduo, nos faça perder de vista a última e mais importante ambição revolucionária, que é a de ver o homem libertado da alienação.

Apesar da carência das instituições, o que deve ser superado gradualmente, as massas agora fazem a história como um conjunto consciente de indivíduos que lutam por uma mesma causa. O homem, no socialismo, apesar de sua aparente padronização, e mais completo; apesar da falta do mecanismo perfeito para isso, sua possibilidade de expressar-se e de influir no aparato social é infinitamente maior.

Mas e preciso ainda acentuar sua participação consciente, individual e coletiva em todos os mecanismos de direção e produção, e ligá-la à idéia da necessidade da educação técnica e ideológica, de maneira que sinta como estes processos são estreitamente interligados e seus avanços paralelos. Deste modo alcançará a total consciência de seu ser social, o que equivale à sua plena realização como criatura humana, uma vez quebradas as correntes da alienação.

Isto se traduzirá concretamente pela reapropriação de sua natureza através do trabalho liberado e a expressão de sua própria condição humana através da cultura e da arte.

Para que se desenvolva na primeira, o trabalho deve adquirir uma nova condição. A mercadoria homem cessa de existir e se instala um sistema, que outorga uma quota pelo cumprimento do dever social. Os meios de produção pertencem à sociedade e a máquina é apenas a trincheira onde o dever é cumprido. O homem começa a libertar seu pensamento da obrigação penosa que tinha de satisfazer suas necessidades animais através do trabalho. Ele começa a se ver retratado em sua obra e a compreender sua magnitude humana através do objeto criado, do trabalho realizado. Isto já não significa deixar uma parte de seu ser em forma de força de trabalho vendida, que não lhe pertence mais, mas significa uma emanação de si mesmo, uma contribuição à vida comum, em que se reflete; o cumprimento do seu dever social.

Fazemos todos o possível para dar ao trabalho esta nova categoria de dever social e uni-lo, por um lado, ao desenvolvimento da técnica que dará condições para uma maior liberdade e, por outro lado, ao trabalho voluntário, embasado na concepção marxista de que o homem realmente alcança sua plena condição humana quando produz sem a compulsão da necessidade física de se vender como mercadoria.

Claro que existem ainda aspectos coercitivos no trabalho, mesmo quando é voluntário; o homem não transformou toda a coerção que o rodeia num reflexo condicionado de natureza social, e produz ainda, em muitos casos, sob a pressão do meio (compulsão moral, como a chama Fidel). Ainda lhe falta conseguir a plena recriação espiritual diante de sua obra, sem a pressão direta do meio social, mas ligado a ele pelos novos hábitos. Isto será o comunismo.

A mudança não se produz automaticamente na consciência como também não se produz na economia. As variações são lentas e não são rítmicas; há períodos de aceleração, outros de estagnação e inclusive de retrocesso.

Devemos considerar também, como já dissemos antes, que não estamos diante do período de transição pura, como o descreveu Marx na Crítica do programa de Gotha, mas numa nova fase não prevista por ele; o primeiro período de transição do comunismo ou da construção do socialismo. Isto se dá em meio de lutas de classe violentas e com elementos de capitalismo em seu seio, que obscurecem a compreensão cabal de sua essência.

Se a isto acrescentamos o escolasticismo que freou o desenvolvimento da filosofia marxista e impediu o tratamento

sistemático do período, cuja economia política não se desenvolveu, devemos convir que ainda estamos no berço e que é preciso dedicar-se a investigar todas as características primordiais deste período antes de elaborar uma teoria econômica e política de maior alcance.

A teoria resultante dará maior importância aos dois pilares da construção: a formação do homem novo e o desenvolvimento da técnica. Em ambos os aspectos ainda resta muito por fazer, mas é menos perdoável o atraso no que diz respeito à concepção da técnica como base fundamental, a que neste terreno não se trata de avançar às cegas, mas de seguir durante bom tempo o caminho aberto pelos países mais adiantados do mundo. Por isso Fidel insiste tanto sobre a necessidade da formação tecnológica e científica de todo o nosso povo e mais ainda de sua vanguarda,

No campo das idéias que conduzem a atividades não produtivas, é mais fácil ver a divisão entre a necessidade material e a espiritual. Faz muito tempo que o homem tenta libertar-se da alienação mediante a cultura e a arte. Ele morre diariamente oito ou mais horas por dia enquanto atua como mercadoria, para ressuscitar depois através de sua criação espiritual. Mas este remédio traz os germes da mesma doença: é um ser solitário que busca comunhão com a natureza. Ele defende sua individualidade oprimida pelo meio e reage diante das idéias estéticas como um ser único cuja aspiração é permanecer imaculado.

Trata-se apenas de uma tentativa de fuga. A lei do valor já não e um mero reflexo das relações de produção; os capitalistas monopolistas rodeiam-na de um complicado sistema que a converte numa serva dócil, mesmo que os métodos empregados sejam puramente empíricos. A superestrutura impõe um tipo de arte no qual os artistas têm que ser educados. Os rebeldes são dominados pela maquinaria e somente os talentos excepcionais poderão criar sua obra própria. Os restantes se tornam assalariados envergonhados ou são triturados.

Inventa-se a investigação artística que se dá corno definição da liberdade, mas esta "pesquisa" tem seus limites, imperceptíveis até o momento de se chocar com eles, ou seja, de se colocar os problemas reais do homem em sua alienação. A angústia sem sentido ou o passatempo vulgar constituem válvulas cômodas para a preocupação humana; combate-se a idéia de fazer da arte uma arma de denúncia.

Se as regras do jogo são respeitadas, pode-se obter todas as honras: as que ganharia um macaco ao inventar piruetas. A condição é não tentar escapar da jaula invisível.

Quando a revolução tomou o poder, produziu-se o êxodo dos domesticados; os demais, revolucionários ou não, viram um novo caminho. A pesquisa artística ganhou novo impulso. No entanto, os caminhos estavam mais ou menos traçados e o sentido do conceito fuga se escondeu por trás da palavra liberdade. Os próprios revolucionários mantiveram muitas vezes esta atitude, reflexo do idealismo burguês na consciência.

Em países que passaram por um processo similar, tentou-se combater estas tendências com um dogmatismo exagerado. A cultura geral se converteu em tabu e a representação formalmente exata da natureza foi proclamada o ápice da aspiração cultural, e esta se converteu logo numa representação mecânica da realidade social que se queria fazer ver; a sociedade ideal, quase sem conflitos e contradições, que se tentava criar.

O socialismo é jovem e comete erros. Nós, os revolucionários, carecemos dos conhecimentos e da audácia intelectual necessários para encarar a tarefa do desenvolvimento de um novo homem por métodos diferentes dos convencionais, e os métodos convencionais sofrem a influência da sociedade que os criou (mais uma vez se coloca o tema da relação entre forma e conteúdo). A desorientação e grande e os problemas da construção material nos absorvem. Não existem artistas reconhecidos, que por sua vez tenham autoridade revolucionária. Os homens do Partido devem assumir esta tarefa e tentar conseguir o objetivo principal: educar o povo.

Procura-se então a simplificação, que é o que todo mundo entende e que é também o que os funcionários entendem. A pesquisa artística autêntica é anulada e o problema da cultura geral é reduzido a uma apropriação do presente socialista e do passado morto (portanto, não perigoso). Assim nasce o realismo socialista sobre as bases da arte do século passado.

Mas a arte realista do século XIX também é de classe, talvez mais puramente capitalista do que esta arte decadente do século XX, onde transparece a angústia do homem alienado. O capitalismo em termos de cultua já deu tudo de si e dele não resta nada senão o anúncio de um cadáver fedorento; em arte, sua decadência de hoje.Mas por que pretender buscar nas formas congeladas do realismo socialista a única receita válida? Não se pode opor ao

realismo socialista a "liberdade", porque esta não existe ainda e não existirá até o desenvolvimento completo da sociedade nova, mas não se deve pretender condenar todas as formas de arte posteriores à primeira metade do século XIX, desde o trono pontifício do realismo, pois se cairia num erro proudhoniano de retorno ao passado, colocando camisa de força na expressão artística do homem que nasce e se constrói hoje.

Falta o desenvolvimento de um mecanismo ideológico e cultural que permita a pesquisa e destrua a erva daninha tão facilmente multiplicável no terreno beneficiado pela subvenção estatal.

No nosso país o erro do mecanicismo realista não ocorreu; mas sim um outro de signo contrário. Deu-se por não se ter compreendido a necessidade da criação do homem novo que não seja o representado pelas idéias do século XIX nem tampouco pelas do nosso século decadente mórbido. O homem do século XXI é aquele que devemos criar, mesmo que ainda seja uma aspiração subjetiva e não sistematizada. Este é precisamente um dos pontos fundamentais do nosso estudo e do nosso trabalho e, na medida em que consigamos êxitos concretos sobre uma base teórica ou, vice-versa, se extraiam conclusões teóricas de caráter amplo sobre a base de nossa pesquisa concreta, teremos dado uma contribuição valiosa ao marxismo-leninismo, à causa da humanidade.

A reação contra o homem do século XIX nos fez cair na reincidência do decadentismo do século XX. Não é um erro demasiadamente grave mas devemos superá-lo sob pena de abrir um largo espaço ao revisionismo.

As grandes multidões estão se desenvolvendo, as novas idéias vão alcançando ímpeto adequado no seio da sociedade, e as possibilidades materiais de desenvolvimento integral de absolutamente todos os seus membros tornam o labor muito mais frutífero. O presente é de luta; o futuro é nosso.

Resumindo, a culpa de muitos dos nossos intelectuais e artistas reside em seu pecado original; não são autenticamente revolucionários. Podemos tentar enxertar o olmo para que dê pêras, mas simultaneamente temos que plantar a pereira. As novas gerações estarão livres do pecado original. As probabilidades de que surjam artistas excepcionais serão tanto maiores quanto mais se tenha ampliado o campo da cultura e a possibilidade de expressão. Nossa tarefa consiste em impedir que a geração atual, desarticulada por seus conflitos, se perverta e perverta as novas. Não devemos criar

assalariados dóceis ao pensamento oficial nem "bolsistas" que vivam do amparo governamental, exercendo uma liberdade entre aspas. Logo virão os revolucionários que entoam o canto do homem novo com a voz autêntica do povo. Ê um processo que exige tempo.

Na nossa sociedade a juventude e o Partido Comunista desempenham um grande papel.

A primeira e particularmente importante por ser a matéria maleável com a qual se pode construir o homem novo sem nenhuma das taras anteriores.

Ela recebe um tratamento de acordo com nossas ambições. Sua educação é cada vez mais completa e não esquecemos sua integração com o trabalho desde os primeiros momentos. Nossos bolsistas fazem trabalho físico durante suas férias ou simultaneamente com o estudo. O trabalho em certos casos é um prêmio, em outros um instrumento de educação, mas nunca um castigo. Uma nova geração nasce.

O Partido e uma organização de vanguarda. Os melhores trabalhadores são propostos por seus companheiros para integrá-lo. Ele é minoritário, mas de grande importância pela qualidade de seus quadros. Nossa aspiração e que o Partido seja de massas, mas somente quando as massas tenham alcançado o nível de desenvolvimento da vanguarda; quer dizer, quando estejam educadas para o comunismo. O trabalho é dirigido para esta educação. O Partido é o exemplo vivo: seus quadros devem dar aulas de labor e sacrifício, devem levar, com sua ação, as massas até o fim da tarefa revolucionária, o que implica anos de dura luta contra as dificuldades da construção, dos inimigos de classe, as marcas do passado, o imperialismo...

Eu queria agora explicar o papel desempenhado pela personalidade. pelo homem como indivíduo dirigente das massas que fazem a história. É nossa experiência e não uma receita.

Nos primeiros anos Fidel deu à revolução o impulso, a direção, a tônica sempre, mas existe um bom grupo de revolucionários que se desenvolveram no mesmo sentido que o dirigente máximo, e uma grande massa que segue seus dirigentes porque tem fé neles; tem fé neles porque souberam interpretar seus anseios.

Não se trata de quantos quilos de carne se come ou de quantas vezes por ano alguém pode ir passear na praia, nem de quantas belezas que vêm do exterior podem ser compradas com os salários atuais. Trata-se precisamente do indivíduo se sentir mais pleno, com

muito mais riqueza interior e com muito mais responsabilidade. O indivíduo do nosso país sabe que a época gloriosa em que lhe é dado viver é de sacrifício. Os primeiros o conheceram na Sierra Maestra e onde quer que se tenha lutado; depois o conhecemos em toda Cuba. Cuba é a vanguarda da América e deve fazer sacrifícios por ocupar justamente este lugar e porque indica às massas da América Latina o caminho da liberdade total.

No interior do país os dirigentes devem cumprir seu papel de vanguarda; e temos que dizê-lo com toda a sinceridade, em uma revolução verdadeira, na qual se dá tudo, da qual não se espera nenhuma retribuição material: a tarefa do revolucionário de vanguarda e ao mesmo tempo magnífica e angustiante.

Deixe-me dizer, com o risco de parecer ridículo, que o verdadeiro revolucionário é guiado por grandes sentimentos de amor. É impossível pensar num revolucionário autêntico sem esta qualidade. Talvez este seja um dos grandes dramas do dirigente: ele deve unir a um espírito apaixonado uma mente fria, e tomar decisões dolorosas sem contrair um único músculo. Nossos revolucionários de vanguarda devem idealizar este amor aos povos, às causas mais sagradas, e torná-lo único e indivisível. Não podem baixar com sua pequena dose de carinho cotidiano até os lugares onde o homem comum o pratica.

Os dirigentes da revolução têm filhos que em seus primeiros balbucios não aprendem a chamar o pai; mulheres que devem ser parte do sacrifício geral de sua vida para levar a revolução ao seu destino; o marco dos amigos corresponde estritamente ao marco dos companheiros de revolução. Não há vida fora dela.

Nestas condições deve-se ter grande dose de humanidade, grande dose de sentimentos de justiça e de verdade para não cair em extremos dogmáticos, em escolasticismos frios, em isolamento das massas. Todos os dias deve-se lutar para que este a mor à humanidade viva se transforme em fatos concretos, em atos que sirvam de exemplos, de mobilização.

O revolucionário, motor ideológico da revolução dentro do seu Partido, se consome nessa atividade ininterrupta, cujo único fim é a morte, a não ser que a construção se realize em escala mundial. Se sua vontade de revolucionário diminui quando as tarefas mais prementes estão realizadas em escala local, e se esquece o internacionalismo proletário, a revolução que dirige deixa de ser uma força impulsionadora e acaba numa modorra cômoda da qual se aproveitam nossos inimigos irreconciliáveis, o imperialismo, que ganha

terreno. O internacionalismo proletário é um dever mas também uma necessidade revolucionária. Deste modo educamos nosso povo.

Claro que existem perigos presentes nas circunstâncias atuais. Não apenas o dogmatismo, não apenas de congelar as relações com as massas durante a grande tarefa, mas existe também o perigo das debilidades nas quais se pode cair. Se o homem pensa que para dedicar sua vida inteira à revolução ele não pode distrair sua mente com a preocupação da falta de um determinado produto produto para o filho, com o fato de os sapatos das crianças estarem acabando, com o fato de sua família carecer de determinado bem necessário, ele, com este raciocínio, deixa de infiltrar-se pelo germe da futura corrupção.

No nosso caso, estabelecemos que nossos filhos devem ter e carecer daquilo que têm e daquilo que carecem os filhos do homem comum; nossa família deve compreendê-lo e lutar por isso. A revolução se faz através do homem, mas o homem deve forjar dia a dia seu espírito revolucionário.

Assim vamos andando. À cabeça da imensa coluna – não temos vergonha nem estamos intimidados em dizê-lo – está Fidel, depois estão os melhores quadros do Partido e imediatamente depois, tão perto que sua enorme força pode ser sentida, está o povo em seu conjunto; sólida armação de individualidades que caminham até um fim comum; indivíduos que chegaram à consciência do que e necessário fazer; homens que lutam para sair do reino da necessidade e entrar no da liberdade.

Esta imensa multidão se ordena; sua ardem corresponde à consciência da necessidade dela; já não e mais uma força dispersa, divisível em mil frações projetadas no espaço como fragmentos de granadas, procurando apenas alcançar, utilizando-se de qualquer meio, numa luta travada contra seus semelhantes, uma posição ou algo que dê uma segurança diante de um futuro incerto.

Sabemos que existem sacrifícios à nossa frente e que devemos pagar um preço pelo fato heróico de constituir uma vanguarda como nação. Nós, dirigentes, sabemos que temos um preço a pagar por ter o direito de dizer que estamos à cabeça de um povo que está à cabeça da América. Todos e cada um de nós paga pontualmente sua quota de sacrifício, conscientes de receber o prêmio na satisfação do dever cumprido, conscientes de avançar com todos até o homem novo que se vislumbra no horizonte.

Permita-me tentar avançar algumas conclusões

Nós, socialistas, somos mais livres porque somos mais plenos; somos mais plenos por sermos mais livres.

O esqueleto da nossa liberdade completa está formado; falta-lhe apenas a substância protéica e a roupagem; nós as criaremos.

Nossa liberdade e sua sustentação quotidiana têm cor de sangue e estão repletas de sacrifícios.

Nosso sacrifício é consciente; quota para pagar a liberdade que construímos.

O caminho é longo e em parte desconhecido; conhecemos nossas limitações. Faremos o homem do século XXI; nós mesmos.

Nós nos forjaremos na ação quotidiana, criando um homem novo com uma nova técnica.

A personalidade desempenha o papel de mobilização e de direção enquanto encarna as mais altas virtudes e aspirações do povo e enquanto não se afasta do caminho.

Quem abre o caminho é o grupo de vanguarda, os melhores dentre os bons, o Partido.

O alicerce fundamental da nossa obra é a juventude: depositamos nossa esperança nela e preparamo-la para tomar a bandeira das nossas mãos.

Se esta carta balbuciante esclarece alguma coisa, está cumprindo o objetivo a que me propus.

Receba nossa saudação ritual, com um aperto de mãos ou um “Ave-maria puríssima”. Pátria ou Morte.

Reproduzido de GUEVARA, E. El socialismo y el hombre en Cuba. In: Obras. t. 2, p. 367-84, Casa de Las Américas.

Homens e máquinas

, por Antônio Ozaí

Estes dias assisti o filme O Grande Ditador, de Charles Chaplin. Já o tinha visto na década de 1980, mas foi como vê-lo pela primeira vez. Ao ouvir o discurso do “judeu barbeiro” recordei que o tinha em forma de pôster, o qual foi deteriorado pela umidade da casa em que morava. Compreendi melhor várias falas e cenas. Inclusive porque hoje temos a vantagem das novas tecnologias. O DVD permite acesso a extras, a informações que não tinha naquela época. Por outro lado, a idade também indica acúmulo de conhecimento e experiência, o que também modifica o olhar sobre o objeto. Oxalá, tivesse tempo e condições para reler e rever os livros e filmes do passado!


Um dos trechos que mais admiro do discurso de Charles Chaplin é este: “Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.”

Foi uma dádiva poder ouvi-lo novamente. Isto me fez reviver antigas reflexões sobre o absurdo da coisificação do ser humano. Mas não podemos ficar presos às reminiscências. A arte se justifica na medida em que nos faz refletir sobre a condição humana presente. Como escreve Carlos Drummond de Andrade: “O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente”.


E, seguindo o poeta, passei a refletir sobre as relações que estabelecemos através de emails e blogs. A tecnologia favorece a comunicação e amplia sua abrangência. Recebemos e enviamos mensagens para dezenas e centenas de pessoas, as quais, na maioria, não teríamos qualquer tipo de relacionamento se não houvesse a internet. Há, inclusive, gratas surpresas como a consolidação de amizades virtuais. Porém, em geral não conhecemos quem está do outro lado à frente do monitor do computador.


A máquina intermedeia a comunicação. Mas em que medida as pessoas reconhecem esta como uma relação humana? Será que reduzimos o “outro” a um email e o/ou um blog? Será que nos damos conta de que o indivíduo que recebe a mensagem e lê o comentário postado num blog é alguém em carne e osso, um ser humano? Será que temos o cuidado de respeitar o “outro” em sua subjetividade ou o restringimos à mera posição de receptor? Será que nos perguntamos sobre quem é o “outro” e como se dá a relação virtual? Ou terminamos por estabelecer relações mecânicas?


Considero necessário refletir sobre a interação que adotamos através da máquina. Devemos nos perguntar sobre o caráter e os riscos presentes neste tipo de relacionamento virtual. Afinal, somos homens e mulheres, seres humanos e não máquinas. Não são emails que se comunicam, mas indivíduos concretos. As máquinas são apenas coisas, objetos. É certo que elas dão sentido e, inclusive, transformam o nosso cotidiano. Por isso mesmo, é preciso refletir sobre quem é o “outro” com o qual nos comunicamos, quem recebe nossos emails, quem são os leitores do blog e os que comentam. Muitos se deixam conhecer apenas pelo primeiro nome; outros preferem o anonimato. Como estabelecer um diálogo profícuo nestas condições?

Às vezes, por exemplo, a crítica padece do desconhecimento do "outro" e da facilidade que o meio permite. Tende-se a abstrair e desconsiderar que a relação, ainda que virtual, é entre seres humanos reais. As palavras não existem por si. As máquinas até facilitam sua difusão, mas não substituem os seus portadores, os seres humanos. Não esqueçamos que são estes que se comunicam!

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Tropa de Elite: A criminalização da pobreza

Por Ivan Pinheiro - do Rio de Janeiro

"Homem de preto.
Qual é sua missão?
É invadir favela
E deixar corpo no chão"
(refrão do BOPE)

Não dá cair no papo furado de que Tropa de Elite é " arte pura" ou "obra aberta". Um filme sobre questões sociais não podia ser neutro. Trata-se de uma obra de arte objetivamente ideológica, de caráter fascista, que serve à criminalização e ao extermínio da pobreza. É possível até que os diretores subjetivamente não quisessem este resultado, mas apenas ganhar dinheiro, prestígio e, quem sabe, um Oscar. Vão jurar o resto da vida que não são de direita. Aliás, você conhece alguém no Brasil, ainda mais na área cultural, que se diga de direita?

Como acredito mais em conspirações do que no acaso, não descarto a hipótese de o filme ter sido encomendado por setores conservadores. Estou curioso para saber quais foram os mecenas desta caríssima produção, que certamente foi financiada por incentivos fiscais.

O filme tem objetivos diferentes, para públicos diferentes. Para os proletários das comunidades carentes, o objetivo é botar mais medo ainda na "caveira" (o BOPE, os "homens de preto"). O vazamento escancarado das cópias piratas talvez seja, além de uma estratégia de marketing, parte de uma campanha ideológica. A pirataria é a única maneira de o filme ser visto pelos que não podem pagar os caros ingressos dos cinemas. Aliás, que cinemas? Não existe mais um cinema nos subúrbios, a não ser em shopping, que não é lugar de pobre freqüentar, até porque se sente excluído e discriminado.

No filme, os "caveiras" são invencíveis e imortais. O único que morre é porque "deu mole". Cometeu o erro de ir ao morro à paisana, para levar óculos para um menino pobre, em nome de um colega de tropa que estava identificado na área como policial. Resumo: foi fazer uma boa ação e acabou assassinado pelos bandidos.

Para as classes médias e altas, o objetivo do filme é conquistar mais simpatia para o BOPE, na luta dos "de cima", que moram embaixo, contra os "de baixo", que moram em cima.

Os "homens de preto" são glamourizados, como abnegados e incorruptíveis. Apesar de bem intencionados e preocupados socialmente, são obrigados a torturar e assassinar a sangue frio, em "nosso nome". Para servir à "nossa sociedade", sacrificam a família, a saúde e os estudos. Nós lhes devemos tudo isso! Portanto, precisam ser impunes. Você já viu algum "caveira" ser processado e julgado por tortura ou assassinato? "Caveira" não tem nome, a não ser no filme. A "Caveira" é uma instituição, impessoal, quase secreta.

Há várias cenas para justificar a tortura como "um mal necessário". Em ambas, o resultado é positivo para os torturadores, ou seja, os torturados não resistem e "cagüetam" os procurados, que são pegos e mortos, com requintes de crueldade. Fica outra mensagem: sem aquelas torturas, o resultado era impossível.

Tudo é feito para nos sentirmos numa verdadeira guerra, do bem contra o mal. É impossível não nos remetermos ao Iraque ou à Palestina: na guerra, quase tudo é permitido. À certa altura, afirma o narrador, orgulhoso : "nem no exército de Israel há soldados iguais aos do BOPE".

Para quem mora no Rio, é ridículo levar a sério as cenas em que os "rangers" sobem os morros, saindo do nada, se esgueirando pelas encostas e ruelas, sem que sejam percebidos pelos olheiros e fogueteiros das gangues do varejo de drogas! Esta manipulação cumpre o papel de torná-los ainda mais invencíveis e, ao mesmo tempo, de esconder o estigmatizado "Caveirão", dentro do qual, na vida real, eles sobem o morro, blindados. O "Caveirão", a maior marca do BOPE, não aparece no filme: os heróis não podem parecer covardes!

O filme procura desqualificar a polêmica ideológica com a esquerda, que responsabiliza as injustiças sociais como causa principal da violência e marginalidade. Para ridicularizar a defesa dos direitos humanos e escamotear a denúncia do capitalismo, os antagonistas da truculência policial são estudantes da PUC, "despojados de boutique", que se dão a alguns luxos, por não terem ainda chegado à maioridade burguesa.

Os protestos contra a violência retratados no filme são performances no estilo "viva rico", em que a burguesia e a pequena-burguesia vão para a orla pedir paz, como se fosse possível acabar com a violência com velas e roupas brancas, ou seja, como se tratasse de um problema moral ou cultural e não social.

A burguesia passa incólume pelo filme, a não ser pela caricatura de seus filhos que, na Faculdade, fumam um baseado e discutem Foucault. Um personagem chamado "Baiano" (sutil preconceito) é a personificação do tráfico de drogas e de armas, como se não passasse de um desses meninos pobres, apenas mais espertos que os outros, que se fazem "Chefe do Morro" e que não chegam aos trinta anos de idade, simples varejistas de drogas e armas, produtos dos mais rentáveis do capitalismo contemporâneo. Nenhuma menção a como as drogas e armas chegam às comunidades, distribuídas pelos grandes traficantes capitalistas, sempre impunes, longe das balas achadas e perdidas. E ainda responsabilizam os consumidores pela existência do tráfico de drogas, como se o sistema não tivesse nada a ver com isso!

O Estado burguês também passa incólume pelo filme. Nenhuma alusão à ausência do Estado nas comunidades carentes, principal causa do domínio do banditismo. Nenhuma denúncia de que lá falta tudo que sobra nos bairros ricos. No filme, corrupção é um soldado da PM tomar um chope de graça, para dar segurança a um bar. Aliás, o filme arrasa impiedosamente os policiais "não caveiras", generalizando-os como corruptos e covardes, principalmente os que ficam multando nossos carros e tolhendo nossas pequenas transgressões, ao invés de subirem o morro para matar bandido.

A grande sacada do filme é que o personagem ideológico principal não é o artista principal. Este, branco, é o que mais mata. Ironicamente, chama-se Nascimento. É um tipo patológico, messiânico, sanguinário, que manda um colega matar enquanto fala ao celular com a mulher sobre o nascimento do filho.

Mas para fazer a cabeça de todos os públicos, tanto os "de cima" como os "de baixo", o grande e verdadeiro herói da trama surge no final: Thiago, um jovem negro, pacato, criado numa comunidade pobre, que foi trabalhar na PM para custear seus estudos de Direito, louco para largar aquela vida e ser advogado. Como PM, foi um peixe fora d\'água: incorruptível, respeitava as leis e os cidadãos. Generoso, foi ele quem comprou os óculos para dar para o menino míope. Sua entrada no BOPE não foi por vocação, mas por acaso.

Para ficar claro que não há solução fora da repressão e do extermínio e que não adianta criticar nem fazer passeata, pois "guerra é guerra", nosso novo herói se transforma no mais cruel dos "caveiras" da tropa da elite, a ponto de dar o tiro de misericórdia no varejista "Baiano", depois que este foi torturado, dominado e imobilizado. Para não parecer uma guerra de brancos ricos contra negros pobres, mas do bem contra o mal, o nosso herói é um "caveira" negro, que mata um bandido "baiano", de sua própria classe, num ritual macabro para sinalizar uma possibilidade de "mobilidade social", para usar uma expressão cretina dos entusiastas das "políticas compensatórias".

A fascistização é um fenômeno que vem sendo impulsionado pelo imperialismo em escala mundial. A pretexto da luta contra o terrorismo, criminalizam-se governos, líderes, povos, países, religiões, raças, culturas, ideologias, camadas sociais.

Em qualquer país em que Tropa de Elite passar, principalmente nos Estados Unidos e na Europa, o filme estará contribuindo para que a sociedade se torne mais fascista e mais intolerante com os negros, os imigrantes de países periféricos e delinqüentes de baixa renda.

No Brasil, a mídia burguesa há muito tempo trabalha a idéia de que estamos numa verdadeira guerra, fazendo sutilmente a apologia da repressão. Sentimos isso de perto. Quantas vezes já vimos pessoas nas ruas querendo linchar um ladrão amador, pego roubando alguma coisa de alguém? Quantas vezes ouvimos, até de trabalhadores, que "bandido tem que morrer"?

Se não reagirmos, daqui a pouco a classe média vai para as ruas pedir mais BOPE e menos direitos humanos e, de novo, fazer o jogo da burguesia, que quer exterminar os pobres, que só criam problemas e ainda por cima não contam na sociedade de consumo. Daqui a pouco, as milícias particulares vão se espalhar pelo país, inspiradas nos heróicos "homens de preto", num perigoso processo de privatização da segurança pública e da justiça. Não nos esqueçamos do modelo da "matriz": hoje, os mais sanguinários soldados americanos no Iraque são mercenários recrutados por empresas particulares de segurança, não sujeitos a regulamentos e códigos militares.

Parafraseando Bertolt Brecht, depois vai sobrar para nós, que teimamos em lutar contra o fascismo e a barbárie, sonhando com um mundo justo e fraterno.

A trilha sonora do filme já avisou:

"Tropa de Elite,
Osso duro de roer,
Pega um, pega geral.
Também vai pegar você!"

Ivan Pinheiro é Secretário Geral do Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Por que Zurdo?

O nome do blog foi inspirado no filme Zurdo de Carlos Salcés, uma película mexicana extraordinária.


Zurdo em espanhol que dizer: esquerda, mão esquerda.
E este blog significa uma postura alternativa as oficiais, as institucionais. Aqui postaremos diversos assuntos como política, cultura, história, filosofia, humor... relacionadas a realidades sem tergiversações como é costume na mídia tradicional.
Teremos uma postura radical diante dos fatos procurando estimular o pensamento crítico. Além da opinião, elabora-se a realidade desvendando os verdadeiros interesses que estão em disputa na sociedade.

Vos abraço com todo o fervor revolucionário

Raoul José Pinto



ZZ - ESTUDAR SEMPRE

  • A Condição Pós-Moderna - DAVID HARVEY
  • A Condição Pós-Moderna - Jean-François Lyotard
  • A era do capital - HOBSBAWM, E. J
  • Antonio Gramsci – vida e obra de um comunista revolucionário
  • Apuntes Criticos A La Economia Politica - Ernesto Che Guevara
  • As armas de ontem, por Max Marambio,
  • BOLÍVIA jakaskiwa - Mariléia M. Leal Caruso e Raimundo C. Caruso
  • Cultura de Consumo e Pós-Modernismo - Mike Featherstone
  • Dissidentes ou mercenários? Objetivo: liquidar a Revolução Cubana - Hernando Calvo Ospina e Katlijn Declercq
  • Ensaios sobre consciência e emancipação - Mauro Iasi
  • Esquerdas e Esquerdismo - Da Primeira Internacional a Porto Alegre - Octavio Rodríguez Araujo
  • Fenomenologia do Espírito. Autor:. Georg Wilhelm Friedrich Hegel
  • Fidel Castro: biografia a duas vozes - Ignacio Ramonet
  • Haciendo posible lo imposible — La Izquierda en el umbral del siglo XXI - Marta Harnecker
  • Hegemonias e Emancipações no século XXI - Emir Sader Ana Esther Ceceña Jaime Caycedo Jaime Estay Berenice Ramírez Armando Bartra Raúl Ornelas José María Gómez Edgardo Lande
  • HISTÓRIA COMO HISTÓRIA DA LIBERDADE - Benedetto Croce
  • Individualismo e Cultura - Gilberto Velho
  • Lênin e a Revolução, por Jean Salem
  • O Anti-Édipo — Capitalismo e Esquizofrenia Gilles Deleuze Félix Guattari
  • O Demônio da Teoria: Literatura e Senso Comum - Antoine Compagnon
  • O Marxismo de Che e o Socialismo no Século XXI - Carlos Tablada
  • O MST e a Constituição. Um sujeito histórico na luta pela reforma agrária no Brasil - Delze dos Santos Laureano
  • Os 10 Dias Que Abalaram o Mundo - JOHN REED
  • Para Ler O Pato Donald - Ariel Dorfman - Armand Mattelart.
  • Pós-Modernismo - A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio - Frederic Jameson
  • Questões territoriais na América Latina - Amalia Inés Geraiges de Lemos, Mónica Arroyo e María Laura Silveira
  • Simulacro e Poder - uma análise da mídia, de Marilena Chauí (Editora Perseu Abramo, 142 páginas)
  • Soberania e autodeterminação – a luta na ONU. Discursos históricos - Che, Allende, Arafat e Chávez
  • Um homem, um povo - Marta Harnecker

zz - Estudar Sempre/CLÁSSICOS DA HISTÓRIA, FILOSOFIA E ECONOMIA POLÍTICA

  • A Doença Infantil do Esquerdismo no Comunismo - Lênin
  • A História me absolverá - Fidel Castro Ruz
  • A ideologia alemã - Karl Marx e Friedrich Engels
  • A República 'Comunista' Cristã dos Guaranis (1610-1768) - Clóvis Lugon
  • A Revolução antes da Revolução. As guerras camponesas na Alemanha. Revolução e contra-revolução na Alemanha - Friedrich Engels
  • A Revolução antes da Revolução. As lutas de classes na França - de 1848 a 1850. O 18 Brumário de Luis Bonaparte. A Guerra Civil na França - Karl Marx
  • A Revolução Burguesa no Brasil - Florestan Fernandes
  • A Revolução Proletária e o Renegado Kautsky - Lênin
  • A sagrada família - Karl Marx e Friedrich Engels
  • Antígona, de Sófocles
  • As tarefas revolucionárias da juventude - Lenin, Fidel e Frei Betto
  • As três fontes - V. I. Lenin
  • CASA-GRANDE & senzala - Gilberto Freyre
  • Crítica Eurocomunismo - Ernest Mandel
  • Dialética do Concreto - KOSIK, Karel
  • Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico - Friedrich Engels
  • Do sonho às coisas - José Carlos Mariátegui
  • Ensaios Sobre a Revolução Chilena - Manuel Castells, Ruy Mauro Marini e/ou Carlos altamiro
  • Estratégia Operária e Neocapitalismo - André Gorz
  • Eurocomunismo e Estado - Santiago Carrillo
  • Fenomenologia da Percepção - MERLEAU-PONTY, Maurice
  • História do socialismo e das lutas sociais - Max Beer
  • Manifesto do Partido Comunista - Karl Marx e Friedrich Engels
  • MANUAL DE ESTRATÉGIA SUBVERSIVA - Vo Nguyen Giap
  • MANUAL DE MARXISMO-LENINISMO - OTTO KUUSINEN
  • Manuscritos econômico filosóficos - MARX, Karl
  • Mensagem do Comitê Central à Liga dosComunistas - Karl Marx e Friedrich Engels
  • Minima Moralia - Theodor Wiesengrund Adorno
  • O Ano I da Revolução Russa - Victor Serge
  • O Caminho do Poder - Karl Kautsky
  • O Marxismo e o Estado - Norberto Bobbio e outros
  • O Que Todo Revolucionário Deve Saber Sobre a Repressão - Victo Serge
  • Orestéia, de Ésquilo
  • Os irredutíveis - Daniel Bensaïd
  • Que Fazer? - Lênin
  • Raízes do Brasil - Sérgio Buarque de Holanda
  • Reforma ou Revolução - Rosa Luxemburgo
  • Revolução Mexicana - antecedentes, desenvolvimento, conseqüências - Rodolfo Bórquez Bustos, Rafael Alarcón Medina, Marco Antonio Basilio Loza
  • Revolução Russa - L. Trotsky
  • Sete ensaios de interpretação da realidade peruana - José Carlos Mariátegui/ Editora Expressão Popular
  • Sobre a Ditadura do Proletariado - Étienne Balibar
  • Sobre a evolução do conceito de campesinato - Eduardo Sevilla Guzmán e Manuel González de Molina

ZZ - Estudar Sempre/LITERATURA

  • 1984 - George Orwell
  • A Casa dos Espíritos, de Isabel Allende
  • A Espera dos Bárbaros - J.M. Coetzee
  • A hora da estrela - Clarice Lispector
  • A Leste do Éden - John Steinbeck,
  • A Mãe, MÁXIMO GORKI
  • A Peste - Albert Camus
  • A Revolução do Bichos - George Orwell
  • Admirável Mundo Novo - ALDOUS HUXLEY
  • Ainda é Tempo de Viver - Roger Garaud
  • Aleph - Jorge Luis Borges
  • As cartas do Pe. Antônio Veira
  • As Minhas Universidades, MÁXIMO GORKI
  • Assim foi temperado o aço - Nikolai Ostrovski
  • Cem anos de solidão - Gabriel García Márquez
  • Contos - Jack London
  • Crime e castigo, de Fiódor Dostoiévski
  • Desonra, de John Maxwell Coetzee
  • Desça Moisés ( WILLIAM FAULKNER)
  • Don Quixote de la Mancha - Miguel de Cervantes
  • Dona flor e seus dois maridos, de Jorge Amado
  • Ensaio sobre a Cegueira - José Saramago
  • Ensaio sobre a lucidez, de José Saramago
  • Fausto - JOHANN WOLFGANG GOETHE
  • Ficções - Jorge Luis Borges
  • Guerra e Paz - LEON TOLSTOI
  • Incidente em Antares, de Érico Veríssimo
  • Memórias do Cárcere - Graciliano Ramos
  • O Alienista - Machado de Assis
  • O amor nos tempos do cólera - Gabriel García Márquez
  • O Contrato de Casamento, de Honoré de Balzac
  • O Estrangeiro - Albert Camus
  • O homem revoltado - Albert Camus
  • O jogo da Amarelinha – Júlio Cortazar
  • O livro de Areia – Jorge Luis Borges
  • O mercador de Veneza, de William Shakespeare
  • O mito de Sísifo, de Albert Camus
  • O Nome da Rosa - Umberto Eco
  • O Processo - Franz Kafka
  • O Príncipe de Nicolau Maquiavel
  • O Senhor das Moscas, WILLIAM GOLDING
  • O Som e a Fúria (WILLIAM FAULKNER)
  • O ULTIMO LEITOR - PIGLIA, RICARDO
  • Oliver Twist, de Charles Dickens
  • Os Invencidos, WILLIAM FAULKNER
  • Os Miseravéis - Victor Hugo
  • Os Prêmios – Júlio Cortazar
  • OS TRABALHADORES DO MAR - Vitor Hugo
  • Por Quem os Sinos Dobram - ERNEST HEMINGWAY
  • São Bernardo - Graciliano Ramos
  • Vidas secas - Graciliano Ramos
  • VINHAS DA IRA, (JOHN STEINBECK)

ZZ - Estudar Sempre/LITERATURA GUERRILHEIRA

  • A Guerra de Guerrilhas - Comandante Che Guevara
  • A montanha é algo mais que uma imensa estepe verde - Omar Cabezas
  • Da guerrilha ao socialismo – a Revolução Cubana - Florestan Fernandes
  • EZLN – Passos de uma rebeldia - Emilio Gennari
  • Imagens da revolução – documentos políticos das organizações clandestinas de esquerda dos anos 1961-1971; Daniel Aarão Reis Filho e Jair Ferreira de Sá
  • O Diário do Che na Bolívia
  • PODER E CONTRAPODER NA AMÉRICA LATINA Autor: FLORESTAN FERNANDES
  • Rebelde – testemunho de um combatente - Fernando Vecino Alegret

ZZ- Estudar Sempre /GEOGRAFIA EM MOVIMENTO

  • Abordagens e concepções de território - Marcos Aurélio Saquet
  • Campesinato e territórios em disputa - Eliane Tomiasi Paulino, João Edmilson Fabrini (organizadores)
  • Cidade e Campo - relações e contradições entre urbano e rural - Maria Encarnação Beltrão Sposito e Arthur Magon Whitacker (orgs)
  • Cidades Médias - produção do espaço urbano e regional - Eliseu Savério Sposito, M. Encarnação Beltrão Sposito, Oscar Sobarzo (orgs)
  • Cidades Médias: espaços em transição - Maria Encarnação Beltrão Spósito (org.)
  • Geografia Agrária - teoria e poder - Bernardo Mançano Fernandes, Marta Inez Medeiros Marques, Júlio César Suzuki (orgs.)
  • Geomorfologia - aplicações e metodologias - João Osvaldo Rodrigues Nunes e Paulo César Rocha
  • Indústria, ordenamento do território e transportes - a contribuição de André Fischer. Organizadores: Olga Lúcia Castreghini de Freitas Firkowski e Eliseu Savério Spósito
  • Questões territoriais na América Latina - Amalia Inés Geraiges de Lemos, Mónica Arroyo e María Laura Silveira